domingo, 1 de julho de 2012



Após o vôo cancelado, o quarto do hotel reservado para mim era o que eu esperava. Duas camas king size, banheira de primeira e preços do cardápio na estratosfera. Depois de aproveitar o banho fui direto para TV. Passando rápido pelos canais você percebe quando alcança a PBS, a televisão pública americana. Já tinha percebido isso outras vezes. Enquanto a gente vê o Tom Cruise pulando num sofá feito um idiota num outro canal, aqui ele participa de um talk show falando sobre a construção do personagem no filme do Kubrick. Naquele momento estavam entrevistando jovens atores de Hollywood com uma profundidade que eu não imaginava que aquelas pessoas tinham. Eram duas horas da manhã e mudei o canal mais uma vez. Alcancei a NHK, que estava passando uma série de documentários sobre lugares inóspitos. Na manhã seguinte liguei a TV de novo na PBS. Passava uma série documental. Um cara tentava descobrir a origem de um objeto, no caso, duas placas metálicas para reprodução em série de uma partitura de TAKE A TRAIN, de Duke Ellington. Tentando descobrir a origem daquele objeto o detetive conversava com especialistas, museólogos, e músicos. O objeto nos levava a uma viagem pela história da música americana, pelo bairro negro do Harlem, pelas linhas de metrô de Nova York e por projetos sociais que mantêm essa cultura viva, enquanto estávamos presos a estrutura de uma investigação policial. Eu estava assistindo a um puta documentário televisivo com força para segurar um espectador mediano e terminava com o dono das placas descobrindo que elas eram usadas para tocar uma versão para piano-solo da música (as pessoas tinham pianos em casa antigamente) e pode ter sido arranjada pelo próprio Ellington, para ganhar uma graninha a mais, ou por uma pessoa não identificada, uma versão antiga da pirataria musical de hoje. Terminado o episódio o programa convidava o espectador a enviar email ao programa propondo uma nova investigação sobre objeto que tivesse em casa. Mudei de canal e bati na HBO passando um documentário incrível “FIRE AND ICE”, sobre a profunda rivalidade e amizade entre dois mitos do esporte, John McEnroe e Björn Borg. Esse é provavelmente um dos melhores documentários que já assisti. Depois disso me vesti e fui ao aeroporto antes que perdesse o vôo assistindo documentários viciantes.




Fiquei pensando, por que temos uma TV pública tão desinteressante? É difícil assim? No domingo às 7 da noite passa o Faustão, o Silvio Santos e a alternativa da principal TV pública brasileira é um programa de debates sobre a maternidade. Nada contra, mas programa para mães no domingo à noite?


3 comentários:

  1. Espero que você não tenha perdido o vôo.
    Eu fico impressionada com os documentários americanos por conta disso... São assuntos as vezes banais, mas tratados de maneira tão interessante, não?!
    No Brasil também se faz esse tipo de documentário, mas as pessoas estão mais preocupadas que ninguém entenda.... Querem que o público "leia nas entrelinhas", sabe?! Só que esquecem de colocar as linhas...
    E, quando os documentários são bem feitos, as pessoas já cansaram de assistir um monte de documentário difícil demais para ser assistido.
    Depois disso, a TV deixa de exibir esse conteúdo...
    Agora, alguém tentar chegar no meio do caminho... isso parece ser um percurso grande demais para ser percorrido, infelizmente.
    Mas alguém vai ter que mudar isso, de alguma maneira.
    Não conseguiram fazer o Castelo Ra Tim Bum, programação infantil tão legal?
    Revoluções podem acontecer...
    bjs

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    1. Rsrsrs. Adorei a falta de linhas.

      Acho que o documentário brasileiro é de matriz muito cinematográfica e há uma forte influência de uma certa espontaneidade em fazer documentário. É algo como ir, filmar, e mostrar. O cinema do real e isso, muitas vezes, prescinde de coisas como estrutura narrativa ou dramática. Não é uma forma nem inferior, nem superior à outras formas, mas com certeza é uma que acaba não atraindo o público. Me parece que os relatos que chegam à respeito da emissoras públicas estarem com receio de continuar o DOCTV provêm daí. Os documentários repetiam esse padrão.

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    2. Só mais uma coisa: perdi o avião não. Deu até para tomar uma daquelas cervejas vermelhas que eu gosto.

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